De 28 a 30 de maio a SOF realizou o Seminário Internacional Reorganização do trabalho doméstico e de cuidados: por outro paradigma de sustentabilidade da vida humana. Participaram cerca de 170 mulheres de movimentos populares, urbanos e rurais, do movimento de mulheres e sindical, pesquisadoras e docentes, gestoras públicas de 20 estados do Brasil, além de convidadas da Argentina, Peru, Bolívia, El Salvador e Espanha.

A organização do seminário permitiu que fossem apresentadas as formulações sobre o trabalho das mulheres a partir da economia feminista e dos acúmulos construídos pelo movimento de mulheres da América Latina, colocando este debate no centro das reflexões sobre alternativas de integração regional que contribuam para a igualdade entre homens e mulheres. As análises sobre o trabalho doméstico no Brasil se combinaram com os desafios políticos e, à luz das análises de experiências de socialização do trabalho doméstico protagonizadas por mulheres, os debates aprofundaram essa questão e apontaram caminhos para alterar a divisão sexual do trabalho, concretizando propostas.

Na primeira conferencia, Cristina Carrasco, economista feminista de Barcelona, apresentou as bases da reflexão da economia feminista, colocando o trabalho de cuidados como central para o funcionamento da sociedade e o desenvolvimento dos indivíduos. Entre os principais elementos da conferência está o significado da busca de igualdade, no sentido de que o objetivo de conquistar igualdade não pode ser limitado à igualdade no mundo masculino, a partir dos parâmetros já estabelecidos que ocultam e desqualificam as experiências das mulheres. O conteúdo da igualdade deve estar carregado de uma profunda ruptura com o modelo, e é nesse sentido que se coloca a sustentabilidade da vida humana como objetivo da organização da economia.

O segundo dia começou com um painel sobre as perspectivas teóricas e os desafios políticos da questão do trabalho doméstico no Brasil, com a apresentação de Bila Sorj, da UFRJ. Os dados da PNAD demonstram a desigualdade na realização do trabalho doméstico, mas as pesquisas ainda não dão conta de apreender a complexidade do assunto. Umas das questões muito presente nesse debate foi sobre o emprego doméstico, realidade de muitas mulheres trabalhadoras no Brasil. Esse tema apareceu a partir da necessidade de garantir os direitos das empregadas domésticas, mas também, e especialmente, a partir da abordagem de como essas mulheres resolvem o trabalho doméstico e de cuidados de suas próprias famílias. Nesse sentido, o enfoque priorizado foi o da necessidade de reorganização do trabalho doméstico como um todo na sociedade.

As experiências de socialização do trabalho doméstico protagonizada por mulheres na Argentina, Peru e Brasil, com os obstáculos e avanços percebidos, apontaram para que o trabalho reprodutivo saia da responsabilidade individual de cada mulheres dentro de sua família, visibilizando esse trabalho no espaço publico e politizando. Tais Viudes de Freitas e Maria Lucia da Silveira apontaram que, nas experiências estudadas, foram percebidos o aumento da autoestima das mulheres e a possibilidade de construção de autonomia em outras esferas da vida. No debate foi apontada a necessidade de que o movimento de mulheres reivindique do Estado a responsabilidade com o cuidado especialmente das crianças e dos idosos, além de que se ampliem as iniciativas do poder público de restaurantes populares.

No debate sobre as alternativas de integração regional, Nalu Faria, coordenadora da REMTE, apresentou os acúmulos do movimento de mulheres neste processo, que envolve a REMTE, a Marcha Mundial das Mulheres, as mulheres da CLOC/Via Campesina, entre outras aliadas. Entre os desafios estão recolocar o trabalho com centralidade na economia e na geração de riqueza, recuperar o papel do Estado como provedor de direitos e visibilizar as formas de fazer economia que não se caracterizam como economia de mercado, como é o caso da economia solidária e camponesa. Lourdes Montero, da REMTE Bolívia, apresentou o exemplo concreto do processo de mudanças em curso na Bolívia, e os desafios para a incorporação de políticas que alterem a divisão sexual do trabalho. Miriam Nobre, da MMM, apontou elementos importantes no debate, como a necessidade de formulação sobre que tipo de institucionalidade é desejável para garantir a perspectiva feminista nas políticas de integração regional.

A apresentação do processo de construção de indicadores não androcêntricos, realizado na Espanha, foi importante para visualizar formas de concretizar esse debate da sustentabilidade da vida nas políticas. O objetivo desses indicadores é incorporar as experiências das mulheres e pretende medir as capacidades e o acesso a recursos, a uma vida sem violência, aos cuidados, à educação e ao conhecimento, ao trabalho remunerado em condições adequadas, etc. Assim, o enfoque e os objetivos dos indicadores são transformados.

O seminário também contou com a presença de Carmem Deere, da Universidade de Massachussets/EUA, que apresentou o debate sobre a construção da autonomia das mulheres no campo, que exige a reforma agrária e o acesso das mulheres a terra, mas também outros elementos da organização mesma da produção nos assentamentos, como as decisões sobre o que e como produzir, a posse de pequenos animais, entre outras questões.

A finalização do seminário contou com um painel para debater os desafios e concretizar propostas para incorporar esse tema na agenda do movimento de mulheres e posicionar o debate geral sobre alternativas de integração.