“Violência e desigualdade no Brasil” é o título da mais recente publicação da Sempreviva Organização Feminista (SOF), que já está disponível para descarregar no sitio web da organização. Elaborada em parceria com a Comissão Pró-Índio (CPI-SP) e com apoio da Christian Aid, a publicação traz artigos que discutem as conexões entre violência e desigualdade no contexto brasileiro, a partir das dimensões de gênero, raça e sexualidade.

O processo de reflexão também teve o aporte de outras organizações parceiras como a União de Núcleos, Associações dos Moradores de Heliópolis e Região (UNAS), o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e o Serviço Anglicano de Diaconia e Desenvolvimento (SADD).

O estudo revela que as muitas ações para reduzir as desigualdades realizadas no período de 2003 a 2013, como as políticas de valorização do salário mínimo, de formalização do emprego, de segurança alimentar, além da ampliação dos serviços públicos, entre outras, não foram suficientes para conter o crescimento da violência nas últimas três décadas. Isso evidencia que a violência é um mecanismo de manutenção da ordem e de perpetuação das desigualdades.

Estudos de caso

O artigo introdutório e os três estudos de caso que integram a pesquisa – sobre a violência contra mulheres jovens no espaço público, contra a população LGBT e nas comunidades quilombolas em resistência à mineração – mostram que existe hoje no Brasil uma ofensiva conservadora que resulta no recrudescimento da violência contra as mulheres e contra a população negra, no controle do corpo e da sexualidade e no cerceamento dos direitos territoriais das comunidades tradicionais.

O primeiro deles mostra como o medo do estupro e de outras formas de violência limita a liberdade e a circulação das mulheres jovens pela cidade e como outras formas de violência, como a desqualificação intelectual, as oprime nas universidades.

O segundo, a respeito das percepções sobre sexualidade, gênero e violência entre LGBTs, revela que desde a infância essas pessoas enfrentam diferentes formas de violência e discriminação, seja na escola ou no ambiente familiar. A rua e os lugares públicos aparecem como os espaços mais perigosos para essa população.

O terceiro estudo de caso, coordenado pela CPI-SP, trata das comunidades quilombolas de Oriximiná, no Pará, que resistem aos projetos da Mineradora Rio do Norte (MRN) em seus territórios tradicionais. As desigualdades econômicas, sociais e de poder cerceiam suas possibilidades de influenciar decisões que afetam suas vidas, mesmo em processos que se pretendem democráticos, como a consulta livre, prévia e informada. A violência estrutural marca esses processos, que produziram sérios danos aos quilombolas, como  conflitos e divisões internas, insegurança e perturbação da paz.

Metodologia de elaboração

Além da captação e análise de dados estatísticos, a pesquisa buscou aprofundar a reflexão tendo como ponto de partida a dimensão coletiva e pública da articulação violência e desigualdades. O texto de análise estatística e as propostas para os estudos de caso foram apresentados em um seminário realizado em agosto de 2016 que contou com a participação de 16 mulheres e 3 homens das regiões sudeste e nordeste do país. Esse seminário levantou questões a aprofundar e pontos de diálogo entre as diferentes situações analisadas. Em cada estudo de caso, foram utilizadas diferentes metodologias, desde entrevistas para levantamento de dados quantitativos e qualitativos, grupos focais, questionário online até a etnografia.

O olhar das pesquisadoras se dirigiu para violência sexual que, além de ocorrer majoritariamente no espaço público, é praticada na maioria das vezes por agressores desconhecidos. Essa perspectiva contribui para ampliar a compreensão sobre as dinâmicas da violência, uma vez que a maioria dos estudos no Brasil costuma se referir à violência sexista majoritariamente praticada no espaço privado e por cônjugues e ex-cônjugues.

Buscou-se também explicitar como a violência em articulação com as desigualdades sociais vai além da dimensão pessoal, da violência física e familiar e permeia distintos espaços e relações sociais, ocorrendo também a partir das instituições públicas e privadas.

Já os estudos sobre a resistência quilombola em Oriximiná mostram que a violência é uma forma de coação das pessoas e também da natureza, que se insere na dinâmica de exclusão de direitos territoriais e de acesso aos bens naturais. Nesse estudo, são mostradas as nuances da violência do setor privado e como essa alcança as pessoas e também as regiões onde elas vivem, especialmente no espaço rural e nos territórios de comunidades tradicionais.

Ao fazer essa análise da violência no espaço público, a publicação tem o objetivo de auxiliar a traçar estratégias de resistência e recolocar um horizonte de transformação.

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