Mais de 100 mulheres, entre militantes, técnicas e artistas, estiveram reunidas nos dias 3 e 4 de setembro para organizar a 2ª Virada Feminista da cidade. Durante as 24h de atividades, cerca de duas mil pessoas passaram pelo Centro Cultural da Juventude, equipamento público que recebeu o evento organizado pela Marcha Mundial das Mulheres e pela SOF, ponto de cultura feminista de São Paulo.

A programação, com cerca de 80 atividades, foi organizada a partir do tema “A resistência que transforma”, com a proposta de visibilizar as resistências coletivas e cotidianas das mulheres no meio artístico. Teatro, dança, literatura, música, cyberativismo, cinema, graffiti, fotografia e artes visuais integraram a densa programação. Pelos eixos “corpo”, “cidade” e “luta”, as mulheres agregaram reflexões sobre os territórios das mulheres e o lugar do feminismo na conjuntura atual.

Feminismo contra o golpe

A Virada Feminista aconteceu no primeiro fim de semana após concretizar-se o mais recente golpe contra a democracia. A Marcha Mundial das Mulheres é um dos movimentos sociais que vem denunciando o avanço do conservadorismo e hoje se mobiliza nas ruas, redes e roçados pelo Fora Temer.

A revolta contra a série de retrocessos impostos pelo golpe esteve presente durante toda a Virada. Foram muitas as vezes em que as mulheres presentes afirmaram “é golpe!” ou “primeiramente fora Temer” durante a introdução de uma apresentação, atividade ou debate.

“Estamos em luta todos os dias, até que sejamos livres do machismo, do racismo, da lesbofobia e do autoritarismo que hoje se instala em nosso país. A Virada Feminista é parte da nossa luta pela democracia, porque a democracia é um bem muito caro para homens e mulheres de todo o país. E porque nós sabemos que, em tempos autoritários, os que mais sofrem somos as mulheres, a juventude, a classe trabalhadora, a população negra, periférica e LGBT. É por isso que hoje estamos reunidas mais uma vez para denunciar o golpe, reivindicar eleições diretas já e dizer que com a democracia não se brinca”, disse Sarah de Roure durante uma apresentação da Fuzarca Feminista.

Corpo e cidade, os territórios das mulheres

Apesar de priorizar e incentivar a reflexão política através das linguagens artísticas, três debates centrais aconteceram durante a Virada. Em “Autonomia e liberdade, o corpo das mulheres na resistência feminista”, as debatedoras partiram da condição de controle sobre os corpos e sexualidades das mulheres para então refletir sobre as alternativas feministas. Para elas, as alternativas para a autonomia das mulheres são coletivas, e o autoconhecimento e autocuidado podem ser baseados na troca de saberes, toques e experiências entre mulheres.

No domingo pela manhã, o debate “Territórios feministas e a cidade que queremos” reuniu militantes da MMM, do movimento de moradia e dos movimentos de cultura periférica para uma conversa sobre quais as demandas das mulheres para a construção de uma cidade mais acessível e menos desigual, violenta e militarizada. A partir das questões “cidade para quê? Cidade para quem?”, as mulheres reforçaram as resistências a partir de seus espaços.

“Não tem como mudarmos a cidade só da porta de casa para fora”, disse Tica Moreno, da SOF, sobre a necessidade de lutar pela mudança do mundo privado, e não apenas do mundo público. A cultura é uma importante ferramenta para a resistência das mulheres, como parte de um processo coletivo das mulheres de ocuparem espaços como os saraus ou auto organizarem novos espaços.

Além destes debates, outras rodas de conversa foram marcantes para a Virada Feminista por impulsionarem reflexões sobre a luta das mulheres negras na cultura. São exemplos disso a “Conversa de negras”, organizada pelas militantes negras da Marcha Mundial das Mulheres; a roda sobre literatura negra e periférica com as escritoras Jenyffer Nascimento e Miriam Alves; e a intitulada “Produção audiovisual e resistência feminista”, com a presença das cineastas Yasmin Thayná, Coletiva Vermelha, Viviane Ferreira e Ana Júlia Travia.

Mulheres do campo e da cidade por outra economia

Uma novidade na Virada feminista de 2016 foi a presença das mulheres da AMESOL (Associação de Mulheres da Economia Solidária) e das agricultoras do Vale do Ribeira. Elas organizaram a exposição de seus produtos de artesanato e alimentação e se reuniram para uma roda de conversa e intercâmbio de experiências.

Ainda que suas realidades sejam distintas, o feminismo alterou muitos aspectos de suas vidas cotidianas, desde o reconhecimento de seus trabalhos até a divisão das tarefas domésticas. “A gente vai fazer junto! Trabalhamos juntos na roça, porque ele não vai ajudar em casa?”, disse uma das agricultoras.