A SOF Sempreviva Organização Feminista iniciou na última semana a série de debates “SOF ao vivo”, que reúne integrantes de nossa equipe com convidadas feministas, pesquisadoras, militantes, de organizações aliadas. O primeiro debate trouxe Marilane Teixeira e Nalu Faria para debater sobre economia e feminismo em tempos de pandemia. Marilane é presidenta da SOF, economista, uma referência para o movimento sindical e feminista nos debates sobre o mundo do trabalho. Nalu é psicóloga, coordenadora da SOF e da Marcha Mundial das Mulheres na região das Américas.

Política econômica para garantir a vida
Marilane falou sobre as disputas entre estratégias econômicas para enfrentar a crise que vivemos hoje, devido à pandemia do coronavírus, e colocou a necessidade de “pensar estratégias mais ousadas para conseguir conduzir esse debate, que é colocar o Estado em um lugar fundamental e é preciso inclusive repensar o próprio governo, colocando o papel da luta e do Fora Bolsonaro”. Ela fez um panorama dos antecedentes da atividade econômica do Brasil, de desaceleração, financeirização, austeridade fiscal, privatização, desemprego e redução de direitos. Todos esses elementos vão na contramão dos discursos de Paulo Guedes, ministro da Economia, que vem justificando que a crise encontrou o Brasil em um período de crescimento. “Isso não condiz em nada com a realidade”.

Marilane também trouxe reflexões sobre como funciona esta crise, que, segundo ela, é diferente de crises anteriores por ser “uma crise no mundo real, não a crise no mercado financeiro”. As respostas neoliberais à crise propostas pelo governo de Bolsonaro são limitadas, ligadas aos cortes em serviços e direitos e à privatização de empresas estatais, aprofundando as desigualdades e dificultando um horizonte de saída da crise. O desemprego, além de já ser uma realidade, vem se aprofundando e tende a piorar, especialmente entre os setores mais precários e com menos direitos, onde se concentram principalmente as mulheres negras. O auxílio emergencial, apesar de ser em valor mais alto do que inicialmente proposto pelo governo, ainda é insuficiente para a manutenção da vida, e estima-se que 1/3 da população brasileira necessite do auxílio. Mais da metade das pessoas aprovadas ainda não receberam o auxílio.

Durante o debate, Marilane sugeriu algumas respostas para combater um futuro de profunda recessão, como a emissão de moeda, a garantia dos empregos e da renda, entre outras medidas que requerem, segundo ela, “um outro tipo de política econômica e outra perspectiva para pensar a sociedade”.

Feminismo: colocar a vida no centro
Nalu situou o momento político do Brasil atual, que é fruto do golpe de 2016 contra Dilma Rousseff e do avanço da extrema-direita em nível global, quando teve início “um momento de agudização do conflito entre o capital e a vida, que colocava não só uma relação de exploração do trabalho, mas de ataque às bases da vida, onde muitas vidas eram consideradas descartáveis. Basta a gente ouvir o discurso de Bolsonaro para ver como isso vem se concretizando como uma realidade”. Nalu falou sobre a necessidade de colocar a sustentabilidade da vida no centro da organização social, tanto neste momento extremo na pandemia quanto para além dele.

Ela afirmou que a crise que vivemos é fruto de uma visão de economia baseada no lucro, apartada da sociedade. “A gente não separa a economia e a vida, a política e a economia, a economia e a sociedade”. Para Nalu, uma marca desse momento é escancarar algo que as feministas já denunciam há muito tempo: a precariedade da vida, a desigualdade, o ataque aos bens comuns e naturais e também a importância e o peso do trabalho doméstico e de cuidados na sustentabilidade da vida. Escancara, também, as reais necessidades para garantir a vida.

Nalu elencou as iniciativas articuladas a partir dos movimentos sociais, como a campanha Vamos Precisar de Todo Mundo, organizada pelas Frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo, que coloca, na prática, a solidariedade como uma bandeira de classe. Falou também sobre o plano emergencial das Frentes, que inclui uma série de reivindicações por medidas concretas para conter a crise do coronavírus; e sobre a campanha pela taxação de fortunas, que está vigente com um abaixo-assinado, e que é parte de uma ampla luta por mudanças estruturais e por justiça tributária.

Interação à distância
Estavam presentes mais de 200 pessoas de diversas regiões assistindo em tempo real. No chat, as mulheres colocavam suas contribuições, reflexões, experiências e questões, fazendo assim uma formação coletiva e muitas conexões, mesmo na situação de isolamento social.

Além disso, a equipe da SOF tem participado de muitas outras transmissões ao vivo (as tão faladas “lives”) nas últimas semanas, contribuindo assim para os debates sobre feminismo, economia, política.

No dia 28 de abril, teve início o curso Sementeira de alternativas feministas para o bem viver, organizado pela Marcha Mundial das Mulheres do Chile. Nesse dia, Miriam Nobre (SOF) e a economista feminista Cristina Carrasco falaram sobre “Noções de economia feminista”. Cristina falou sobre as insuficiências da economia convencional e sobre os objetivos da economia feminista – dentre eles, estão a ampliação da noção de trabalho e a colocação do cuidado como um direito. Miriam falou sobre soberania alimentar, sobre a agroecologia como alternativa ao extrativismo, sobre a importância e os aportes das mulheres camponesas e indígenas para a economia e sobre como a economia feminista é trabalhada na Marcha Mundial das Mulheres.

Também foram ao ar:

1. A participação de Tica Moreno no primeiro episódio, intitulado “O (des)valor do cuidado”,  do podcast Cuidar, Verbo Coletivo, organizado por Bruna Angotti, doutora em antropologia pela USP, e Regina Vieira, doutora em direito pela USP e professora da Unoesc.

2. Miriam Nobre na série de debates “Que história é essa, professor?”, do Instituto Federal de Registro (IFSP), junto com a professora Ofélia Maria Marcondes, com o tema “A vida no centro, análises feministas da pandemia”.

3. Sonia Coelho participou do programa “Aqui pra nós”, do Brasil de Fato de Pernambuco, com o tema “Machismo e Isolamento: Qual o impacto para as mulheres?”

4. A presença de Sheyla Saori no debate “Mulheres em rede”, que aconteceu em conferência coletiva, como parte do Enrama Virtual, o Encontro da Rede de Apoio às Mulheres Agroflorestoras.

4. Entrevista com Nalu Faria no portal Diálogos do Sul. Nalu fala sobre a luta contra o governo neoliberal e autoritário de Bolsonaro, sobre ações contra o coronavírus e a campanha pela taxação de grandes fortunas.

5. Tica Moreno no episódio 5 no programa Janela Web, organizado por militantes feministas do Rio Grande do Norte, junto com representantes da CUT, do MST e de movimentos da cultura.