Esta publicação da SOF reúne experiências concretas, enraizadas em diferentes territórios do Sudeste brasileiro, de mulheres envolvidas com a agroecologia. No decorrer da pandemia da Covid-19, elas teceram resistências e formas de existir em conjunto que possibilitaram que a vida — delas e das suas famílias, comunidades e redes — pudesse continuar.

Os textos de Aline Lima, Ana Cruz, Ana Luisa Queiroz, Cecilia Maria Santiago, Fátima Trombini, Isabelle Hillenkamp, Liliam Telles, Maria José Carneiro, Natália Lobo, Nayara Lopes de Castro, Rodica Weitzman e Thalita Rody Machado, organizados por Miriam Nobre são resultado de pesquisas que sistematizam o vivenciado neste momento tão particular enquanto ainda estamos mergulhadas nele. Realizadas por pesquisadoras e ativistas do movimento feminista e agroecológico, demonstram a potência da solidariedade e da partilha do conhecimento entre mulheres com diferentes inserções: instituições de pesquisa e ONG que constroem movimento, em diálogo com as agricultoras.

Os dois primeiros artigos compartilham aprendizados da pesquisa “Vulnerabilidades e resiliência de agricultoras agroecológicas face à pandemia da Covid-19”, realizada no Vale do Ribeira, em São Paulo, e na Zona da Mata de Minas Gerais. Em ambos os casos são analisadas as mudanças causadas pelo isolamento social e a pandemia nos trabalhos de cuidado (saúde, educação, assistência a pessoas em maior vulnerabilidade) e na produção, distribuição e comercialização de alimentos.)

Com a pandemia e as crises que foram aprofundadas neste cenário, reacenderam as críticas feministas ao capitalismo, que colocam em evidência a importância do trabalho muitas vezes invisível e exercido pelas mulheres. O trabalho que faz com que a vida seja mantida. As mulheres reivindicam uma saída política própria para esta crise multidimensional, que não tem a ver com os planos de recuperação econômica que não rompem com a lógica de mercado e com a destruição da natureza em sua raiz. Entendem que as respostas já estão aí, nas práticas cotidianas de solidariedade e cuidado da natureza, muitas vezes esquecidas e vistas como “não política”.

O terceiro artigo “Mulheres na pandemia: agroecologia, cuidado e ação política” traz as primeiras reflexões da pesquisa “Memórias da quarentena”, realizada pelo Núcleo de Pesquisa “Gênero e Ruralidades” do CPDA/UFRRJ e o Grupo de Trabalho Mulheres (GT Mulheres) da Articulação de Agroecologia do Rio de Janeiro (AARJ). A memória das mulheres organizando a sustentabilidade da vida é central no artigo e extremamente necessária em um tempo de crise que parece anular o futuro.

Essa vontade de retornar ao passado não está relacionado a um tipo de saudosismo do “velho normal” que todos conhecemos, repleto de desigualdades e injustiças. O passado ao qual as mulheres se referenciam é o passado em que a lógica de mercado não regia tanto a vida das suas comunidades; em que as formas de cuidado de si e dos outros constituíam saberes importantíssimos, passados de geração a geração; em que a vida tinha um ritmo mais próximo ao da natureza. Durante a pandemia, o cotidiano continuou sendo sustentado sob a base invisível dos conhecimentos tradicionais das mulheres: na agroecologia, na preparação de banhos e chás que fortalecem e curam o corpo, na promoção das práticas econômicas alternativas ao sistema de mercado.

Inspirado nessa busca pelas formas de vivenciar o tempo, entre passado e futuro, surgiu o título dessa publicação, a partir dos versos do poema “No toque do tempo”, de Ana Cruz. Essas ações, quando juntas, demonstram a estratégia das mulheres para sair desse labirinto: trabalhar conforme os fluxos da natureza, regenerando-a e seguindo os conhecimentos ancestrais, fazer com que eles sejam coletivos; circular os frutos desse trabalho entre as pessoas por rotas que não passem pela lógica mercantil e capitalista; fazer tudo isso tecendo alianças que são políticas e também de afeto e companheirismo, rompendo o isolamento imposto pela pandemia, construindo proximidades mesmo à distância.

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Um Meio Tempo preparando Outro Tempo: Cuidados, produção de alimentos e organização de mulheres agroecológicas na pandemia

Organização: Miriam Nobre

Autoras: Aline Lima, Ana Cruz, Ana Luisa Queiroz, Cecilia Maria Santiago, Fátima Trombini, Isabelle Hillenkamp, Liliam Telles, Maria José Carneiro, Natália Lobo, Nayara Lopes de Castro, Rodica Weitzman e Thalita Rody Machado

  1. Agroecologia 2. Economia feminista 3. Feminismo 4.
    Sustentabilidade da vida I. Título