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Nalu Faria é psicóloga, integrante da Coordenação da Marcha Mundial de Mulheres e coordenadora da Sempreviva Organização Feminista (SOF)

Nalu Faria é integrante da Coordenação da Marcha Mundial de Mulheres (MMM), organização com representação em 60 países, inclusive no Brasil. É também coordenadora da Sempreviva Organização Feminista (SOF). Ambas as entidades têm por finalidade ajudar a tornar as mulheres protagonistas das lutas por importantes mudanças na sociedade, entre elas o fim de toda a forma de opressão sobre a mulher. Nesta entrevista, Nalu fala das iniciativas para garantir a transformação desta realidade mundial e a busca pela emancipação feminina.

Jornal Bancário – Quais a principais bandeiras feministas defendidas pela Marcha Mundial de Mulheres?

Nalu Faria – Tanto a Marcha quanto a SOF atuamos a partir de uma visão de que o patriarcado – ou seja a opressão sobre as mulheres – é estruturante das relações sociais e do modelo de sociedade que temos. É isso tem que ser visto articulado ao que é o capitalismo, o racismo, a opressão da sexualidade. Nossas iniciativas têm a ver com uma visão de transformação desta realidade mundial. Atuamos com uma agenda ampla que trata de diversos aspectos. Mas, de forma sucinta, organizamos nossa intervenção a partir dos temas da Marcha Internacional que estão organizados no que chamamos quatro campos de ação que são: o trabalho e a defesa da autonomia econômica das mulheres, divisão equânime do trabalho doméstico, fim da maior valorização do homem no mercado de trabalho. Outro tema é o combate à violência que vemos como mecanismo usado para dominar as mulheres. Exigir punição, acolhimento às agredidas, é preciso, mas também articular estas exigências com a luta pela autonomia econômica, é fundamental para sair de uma situação de violência. O quinto campo de ação é o dos bens comuns e serviços públicos e a questão da paz e desmilitarização. Agora, esses temas são trabalhados de acordo com a realidade dos países. No Brasil nossa agenda é ampla e temos dado ênfase à critica da mercantilização do corpo e da vida das mulheres, o tema da prostituição e legalização do aborto.

Bancário – Qual a posição das duas entidades sobre segurança alimentar, agronegócio e gênero?

Nalu – Já que você tocou neste ponto, tem a ver com o que chamei de terceiro campo de ação da plataforma da Marcha Mundial de Mulheres: os bens comuns e políticas públicas, com a sustentabilidade ecológica e a não mercantilização da natureza. Defendemos, não a segurança alimentar, que trata do direito à alimentação, mas a soberania alimentar, o direito de decidir produzir e consumir alimentos respeitando a nossa cultura. A segurança alimentar não garante isso. Nós consideramos que soberania alimentar é uma formulação que potencializa a critica ao agronegócio, reforça o tema da soberania sobre nossos territórios, da reforma agrária. Nesse debate da soberania alimentar também foi muito importante a atuação das mulheres e a luta pelo reconhecimento do seu papel histórico na produção de alimentos e que não haverá soberania alimentar onde houver relações desiguais entre homens e mulheres.

Bancário – Como a MMM está se envolvendo na campanha pela reforma política e qual a importância desta reforma para a agenda das mulheres?

Nalu – É uma prioridade. O Brasil e outros países da América Latina vivem um momento de mudança social importante. Temos que aprofundar a democracia. Para isso é preciso realizar uma reforma política que não pode ser feita por este Congresso Nacional, mas por uma Assembleia Nacional Constituinte. E um plebiscito sobre a necessidade da Constituinte será fundamental para ajudar neste processo. Temos que questionar o modelo patriarcal que exclui as mulheres das decisões políticas e de uma participação igualitária na sociedade. O modelo patriarcal encara as mulheres como cuidadoras da família, e ainda não as considera como sujeitos políticos plenos. A sociedade tem que mudar esta concepção e deixar de achar natural, por exemplo, que apenas 9% dos parlamentares do Congresso brasileiro sejam mulheres. Ou que a prostituição seja encarada como natural.