Por: Coletivo de Comunicadoras da MMM

“Ela era cabeleireira e manicure. Colocou a tesoura na bolsa e foi-se embora.” Esta fala, que se refere a uma mulher que decidiu romper com um ciclo de violência de seu companheiro, foi uma das várias histórias contadas pelas mulheres que participaram na terça-feira, 15 de agosto, da Gira de Conversa “As dimensões e repercussões da violência e suas formas de enfrentamento pelas mulheres do campo, da floresta e das águas”, na 7a. Marcha das Margaridas, em Brasília (DF). 

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Em rodadas de falas e reflexões, as participantes da gira procuraram responder, em coletivo, três perguntas: Por que as mulheres do campo, das águas e das florestas sofrem violência? Que tipo de violência elas sofrem? Como fazem o enfrentamento dessa violência? A atividade foi mediada por Sônia Coelho (Marcha Mundial das Mulheres) e Edna Calazans (Articulação de Mulheres Brasileiras -ES).

Dezenas de mullheres, principalmente camponesas, contaram histórias suas, de amigas, irmãs, companheiras de luta que vivem a violência patriarcal. Falaram dos enormes obstáculos que as mulheres enfrentam para conseguir viver em liberdade e sem violência, alcançar a autonomia financeira e pessoal. Quando decidem romper relações violentas, a primeira coisa que encaram é o julgamento da sociedade.

Essa violência tem muitas dimensões. Começa pela invisibilidade imposta ao trabalho das mulheres no campo e pela desvalorização de sua produção, ainda que a agricultura familiar e camponesa brasileira seja feita sobretudo por elas. Passa pela inexistência de políticas públicas de acolhimento e proteção das mulheres no campo, florestas e águas. E chega ao cúmulo de invisibizar até mesmo os feminicídios resultantes desse contexto opressor, porque as mortes dessas mulheres são contabilizadas por município e não se registra que aconteceram em áreas rurais.

As mulheres, de forma organizada, desnaturalizam a violência e a denunciam todos os dias. E pressionam por mudanças. Esse enfrentamento é feito de muitas maneiras. A primeira é formar grupos de mulheres, principalmente em territórios onde as políticas públicas não chegam às mulheres, que precisam se autoorganizar para se apoiar, acolher e exigir mudanças. A segunda influenciar os espaços mistos, intervir nos movimentos e sindicatos nos quais as mulheres participam para que essas pautas sejam parte central de sua atuação.

A terceira maneira é a exigência de políticas públicas. Sônia citou como exemplo a recuperação do Pacto Nacional Pelo Enfrentamento da Violência Contra as Mulheres, de forma que recursos para políticas de prevenção, equipamentos de proteção e acolhimento cheguem até os municípios; a necessidade das escolas traballharem as questões do racismo, da violência contra as mulheres e da necessidade de igualdade na formação de meninas e meninos; campanhas educativas permanentes que constranjam agressores – e não somente iniciativas publicitárias, somente nos dias 8 de março; salário mínimo decente e com aumento real.

Alguns sindicatos e cooperativas promovem espaços seguros para que as mulheres falem e ouçam uma às outras e têm direções em que há paridade de gênero. Os movimentos de mulheres em todo o país se auto-organizam para formar redes de acolhimento. A violência patriarcal e o racismo, no entanto, fazem parte da estrutura do sistema capitalista e são seus instrumento para calar as mulheres.

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Por isso, o impacto de conquistas como a Lei Maria da Penha é reduzido por uma implementação cheia de carências: de recursos, de formação dos servidores e servidoras para atender as mulheres, de medidas de proteção, de casas de acolhimento. “Vamos seguir lutando para colocar as mulheres no orçamento”, afirmou Sônia. “Mas nós marchamos não só por politicas púbicas. Marchamos também para transformar este pais e destruir o racismo, o machismo e o capitalismo.”